Willems e a relação entre sons e natureza humana

Por Rosangela Lambert

Edgar Willems (1890-1978) nasceu na cidade de Lanaken, na Bélgica. Filho de músico, recebeu aulas de piano e tocou na fanfarra de sua cidade. Desde cedo, manifestou interesse pela música e pela pintura. Quando criança, gostava de fabricar instrumentos musicais e ensinar solfejo aos irmãos mais novos.

Durante anos seu contato com a música se deu, sobretudo, por meio de experiências autodidatas, compondo e improvisando. Anotava seus pensamentos mais íntimos sobre diferentes aspectos da vida e das diferentes artes. Em 1925, aos 35 anos, iniciou seus estudos no Conservatório de Genebra, na Suíça, onde passou a ministrar, a partir de 1928, aulas de Filosofia e Psicologia da Música.

(Na foto, Edgar Willems)

Em 1929, criou o curso de Desenvolvimento Auditivo para Adultos e, mais tarde, outro para crianças a partir de cinco anos. Em 1956, o Conservatório confiou-lhe os cursos de Iniciação e, posteriormente, o de Pedagogia.

A produção de Willems é essencialmente pedagógica. Escreveu livros, artigos, textos reflexivos e, entre outros trabalhos, os Cadernos Pedagógicos, os quais trazem em detalhes seus procedimentos didáticos. Além de obras escritas, criou também materiais sonoros, como a flauta de êmbolo, o carrilhão intratonal*, o tubo harmônico** e as famílias de sinos***.

Música e psicologia

Willems buscava compreender a correlação entre som e natureza humana. Sua proposta de educação musical tem como princípios norteadores as relações psicológicas estabelecidas entre a música e o ser humano e a ênfase no trabalho prático antes do ensino musical propriamente dito. A audição está ligada à sensibilidade afetiva e à inteligência do homem.

Além disso, defende a necessidade do preparo auditivo antes do ensino de um instrumento musical e considera a audição sob três aspectos: sensorial, afetivo e mental, fazendo uma analogia aos elementos constitutivos da música: o ritmo – físico e sensorial; a melodia – afetivo; e a harmonia – mental.

No entanto, para ele, a melodia é o elemento primaz da música, razão pela qual o canto desempenha o papel mais importante na educação musical dos principiantes, enquanto que o ritmo e a harmonia são meios eficazes para desenvolver a musicalidade e a audição interior. Sobre a melodia, ele afirmaria:

“A melodia é o ato típico da escuta sensível; com ela, entramos no domínio melódico, e é graças a ela que o homem pode cantar sua alegria, suas dores, suas esperanças ou, ainda, simplesmente seu amor pela beleza sonora.”

Seu método de ensino musical segue uma ordem semelhante ao da aquisição da língua materna, sendo acessível a todos. Graças às suas bases ordenadas e “vivas”, assegura o desenvolvimento do ouvido, do sentido rítmico e da musicalidade como um todo.

Willems no Brasil

Com o intuito de divulgar os princípios de sua obra, viajou por vários países, inclusive o Brasil. Em 1963, a convite do compositor alemão Hans Joachin Koellreutter, esteve na Escola de Música da Universidade Federal da Bahia, onde ministrou um curso para jovens professores, tendo retornado em 1971 para novo curso.

Em 1972, convidado pela Faculdade de Educação da Bahia, além de ministrar cursos em Salvador e em São Paulo, assistiu à fundação da Associação dos Professores de Educação Musical da Bahia (Apemba), da qual foi sócio honorário. Willems esteve ainda no Rio de Janeiro, Niterói, Tatuí, Belo Horizonte, Brasília, Ribeirão Preto, São Caetano do Sul, Itabuna e Feira de Santana.

No ano de 1968 foi criada a Fédération Internationale Willems, cuja função é difundir a obra de seu mestre. Seus membros encontram-se em cerca de trinta países. O representante oficial no Brasil é o IEM – Instituto de Educação Musical, fundado em 1992, em Salvador, e dirigido pela educadora Carmen Maria Mettig Rocha.

O método Willems: aprendizado de música semelhante ao da aquisição da língua materna.

As características estruturais e metodológicas, tão bem explicadas por Willems em suas diversas obras, exigem do professor competências específicas, estudo e uma compreensão detalhada das propostas e objetivos, além dos materiais próprios a serem utilizados. Por estas razões, não é comum encontrarmos, no Brasil, pedagogos adeptos desse método em sua forma estrita.

No entanto, o trabalho de Willems nos lega contribuições inquestionáveis e a certeza de que todo educador deve ser um estudioso profundo da natureza humana e da música, de forma que a sua ação se torne completa, interdisciplinar e adequada ao tempo presente.

* Carrilhão intratonal: metalofone no qual um tom está dividido em dezoito partes ou mais partes.

** Tubo harmônico: tubo de plástico que, ao ser girado pelo aluno, emite os sons iniciais da série harmônica, na proporção da força empregada.

*** Família de sinos: jogo de sinos com distâncias intratonais.

Publicado originalmente no blog Terra da Música